sábado, 18 de setembro de 2010

Canção da Plenitude

Não tenho mais os olhos de menina


nem corpo adolescente, e a pele


translúcida há muito se manchou.


Há rugas onde havia sedas, sou uma estrutura


agrandada pelos anos e o peso dos fardos


bons ou ruins.


(Carreguei muitos com gosto e alguns com rebeldia.)






O que te posso dar é mais que tudo


o que perdi: dou-te os meus ganhos.


A maturidade que consegue rir


quando em outros tempos choraria,


busca te agradar


quando antigamente quereria


apenas ser amada.


Posso dar-te muito mais do que beleza


e juventude agora: esses dourados anos


me ensinaram a amar melhor, com mais paciência


e não menos ardor, a entender-te


se precisas, a aguardar-te quando vais,


a dar-te regaço de amante e colo de amiga,


e sobretudo força — que vem do aprendizado.


Isso posso te dar: um mar antigo e confiável


cujas marés — mesmo se fogem — retornam,


cujas correntes ocultas não levam destroços


mas o sonho interminável das sereias.



do livro "Secreta Mirada"

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